terça-feira, agosto 22, 2017

Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Bandeira’, de Zeca Baleiro



Zeca Baleiro iniciou sua carreira discográfica há exatamente 20 anos, com o álbum Por Onde Andará Stephen Fry? [no detalhe, a capa]. A primeira faixa de trabalho era a melancólica “Flor da Pele”, que logo obteve boa execução nas chamadas FMs adultas. A canção citava “Vapor Barato”, de Jards Macalé e Wally Salomão, imortalizada na voz de Gal Costa – e incluía um sampler da gravação original. Naquele mesmo ano, Gal convidou Baleiro para participar de seu Acústico MTV. Juntos, interpretaram justamente a dobradinha “Vapor Barato / Flor da Pele”.

A segunda faixa de trabalho do disco de estreia do maranhense foi “Bandeira”. A exemplo da antecessora, rapidamente se destacou na programação das rádios da época – e foi inserida na trilha da novela Por Amor. Com sua voz peculiar, Baleiro expunha, com uma entonação serena – e o precioso acompanhamento de um acordeon –, imagens contundentes: “Eu não quero ver você cuspindo ódio / eu não quero ver você fumando ópio / para sarar a dor. / Eu não quero ver você chorar veneno”.

Na verdade, a letra de “Bandeira” dialoga com “Belo Belo II”, de Manuel Bandeira. Tanto o poema quanto a canção frisam tudo o que os seus respectivos autores desejam ou não. O refrão, inclusive, cita o verso final da poesia: “Vida, noves fora, zero”. E não por acaso, o título da música é justamente o sobrenome do poeta pernambucano.

Baleiro foi muito feliz na escolha de metáforas como a do “braço da Vênus de Milo acenando ‘tchau’” – a estátua foi encontrada sem os braços em 1820 na ilha grega que passou a lhe emprestar o nome – e do rio Tejo “escorrendo pelas mãos”. O desfecho não poderia mais esperançoso – e tocante: “Se é assim, quero, sim / acho que vim para te ver”. 

Zeca Baleiro editou mais dez álbuns solo, todos elogiados por público e crítica. Contudo, para muita gente, “Bandeira” continua sendo a sua obra-prima.



Veja o vídeo oficial de “Bandeira”. A canção estava sendo trabalhada nas rádios quando o meu pai faleceu – hoje completam exatas duas décadas. Por esse motivo – e por alguns trechos da letra –, marcou para sempre um dos períodos mais tristes de minha vida. E me fez compreender, na prática, o que é “passar agosto esperando setembro”:

sexta-feira, agosto 18, 2017

Robert Plant: novo álbum a caminho


Dois dias após ter publicado um misterioso teaser em suas redes sociais, Robert Plant revelou mais detalhes sobre o seu novo projeto.

Batizado de Carry Fire [no detalhe, a capa], o 11º disco solo do ex-cantor do Led Zeppelin terá 11 faixas e, a exemplo do antecessor, o bom Lullaby And… The Ceaseless Roar [2014], foi gravado na companhia do grupo Sensational Space Shifters. Chrissie Hynde, vocalista do Pretenders, participa da ancestral “Bluebirds Over The Mountain”, gravada anteriormente por Richie “La Bamba” Valens e também pelos Beach Boys.

A primeira música de trabalho — já disponível nos serviços de streaming — é a inédita “The May Queen”, que apresenta uma mistura inusitada de folk com sonoridades orientais, bem ao estilo da banda que o acompanha. No hemisfério norte, “Rainha de Maio” é a figura que personifica o verão.

Carry Fire será lançado mundialmente no dia 13 de outubro. E Robert Plant inicia a sua turnê pelo Reino Unido no logo no mês seguinte.


Lista de faixas:

The May Queen
New World…
Season’s Song
Dance With You Tonight
Carving Up The World Again (A Wall and Not a Fence)
A Way With Words
Carry Fire
Bones Of Saints
Keep It Hid
Bluebirds Over The Mountain
Heaven Sent



Veja o lyric video de “The May Queen:

Da série ‘Frases’: Robert Plant


Em breve, precisarei de ajuda para atravessar a rua e você vem me falar de Led Zeppelin?


(Em entrevista concedida à revista americana Rolling Stone em 2011, Robert Plant expôs, um tanto contrariado, o que pensa sobre a volta de sua antiga banda.)

quinta-feira, agosto 17, 2017

Da série ‘Causos’: ‘That's The Way It Is’, de Elvis Presley


Sempre que penso em Elvis Presley — cujo falecimento completou ontem exatos 40 anos —, inevitavelmente lembro do ótimo That's The Way It Is [1970], trilha sonora do documentário homônimo, batizado no Brasil de Elvis É Assim. Explico.

Quando o Rei do Rock morreu, eu sequer havia chegado na idade escolar. Mesmo assim, não fiquei imune à comoção que tomou conta dos meios de comunicação naquele momento. Ao lado de Roberto Carlos, Elvis instantaneamente se tornou o meu primeiro ídolo. E minha mãe, embevecida com o fascínio do filho tão pequeno pelo cantor, me deu de presente o álbum supracitado. Muito provavelmente aquele foi o meu primeiro disco.

A despeito da pouca idade, logo percebi que tinha um biscoito fino nas mãos. E rapidamente escolhi as minhas preferidas: a arrasadora versão de “You've Lost That Lovin' Feeling”, do produtor Phil Spector (uma das faixas mais tocadas durante a cobertura do funeral do artista), “You Don't Have To Say You Love Me”, além de “Bridge Over Troubled Waters”, pérola de Paul Simon. Sem esquecer, claro, “I Just Can't Help Believin'”, que abre maravilhosamente os trabalhos.

Mas, infelizmente, tudo passa. Em uma ensolarada tarde de sábado, recebemos a visita de uma tia, irmã de minha mãe. Inadvertidamente, eu havia deixado o disco em uma cadeira. Distraída, ela sentou em cima dele, estilhaçando-o. Embora não tenha chorado, não consegui disfarçar minha desolação. Ela percebeu e tentou me consolar: “Oh, não fique triste… A tia vai anotar o nome e comprar um novo para você, está bem?”

Estou esperando até hoje. Felizmente, com o advento do CD, foi lançada uma edição Deluxe. De qualquer forma, ainda guardo a capa vazia do vinil como recordação.


***


Por sorte, meu padrinho, também irmão de minha mãe, sempre foi fá ardoroso do Elvis. E, pouco tempo depois, provavelmente sensibilizado pelo pequeno incidente, tirou de sua coleção a coletânea Disco de Ouro [à esquerda, a capa] e me presenteou. Imediatamente, a bolacha começar a tocar até furar na minha estimada vitrolinha. 

Mas isso é assunto para outra postagem.



Veja o vídeo da infalível “I Just Can't Help Believin'”. Como diria uma obscura canção de Luiz Melodia: “Porque quando um rei diz que é rei / é rei:

sexta-feira, agosto 04, 2017

Da série ‘Causos’: Luiz Melodia (1951 – 2017)


Sempre nutri grande respeito pelo trabalho de Luiz Melodia, falecido hoje, aos 66 anos. Em mais de quatro décadas de carreira discográfica, foi o autor de canções importantes da música brasileira como “Estácio Holly Estácio”, “Magrelinha”, “Juventude Transviada” e, claro, “Pérola Negra” (sucesso na voz de Gal Costa), entre outras. Mas a grande verdade é que, como pessoa, Melodia, infelizmente, não me deixa boas recordações.

Há cerca de dez anos, dirigi-me a um luthier situado na Praça Tiradentes, Centro do Rio, para pedir uma informação. Após subir a enorme escadaria do antigo sobrado, aproximei-me do balcão para esperar o atendimento. De imediato, notei que o homem alto e magro à minha esquerda, acompanhado presumivelmente da esposa, lançou um olhar para mim: era Melodia. 

Sorridente, cumprimentei-o em voz baixa: “Luiz Melodia, boa tarde”. Por alguma razão que até hoje não consigo compreender, ele sentiu-se, pasmem, desconfortável com o cumprimento. E, para meu espanto, colocou-se à esquerda da jovem senhora que o acompanhava, no intuito de se afastar.

Desapontado, esperei que um funcionário do estabelecimento me atendesse, tirei a dúvida que precisava, agradeci e me retirei. Assim que virei as costas, percebi que Melodia me observava. Mas não olhei para ele novamente.

Enquanto caminhava, lembrei de uma entrevista que o cantor concedeu, em 1996, ao Barão Vermelho, na extinta revista Bizz. Na ocasião, a banda carioca havia acabado de lançar Álbum, com regravações de Ângela Rô Rô (“Amor, Meu Grande Amor”), Gang 90 (“Perdidos na Selva”) e do próprio Melodia (“Vale Quanto Pesa”), entre outros. Em um determinado trecho da conversa, ele disparou: “Sempre digo para os artistas que me regravam que pego o CD deles e ouço só a minha música”. Após o lamentável episódio do luthier, concluí que ele provavelmente não estava brincando com o grupo.

Neste dia, reforcei a minha convicção de que, como seres humanos, artistas podem ser muito diferentes da imagem pública que constroem. E, com a minha dificuldade em “separar a pessoa Física da Jurídica”, confesso que, desde então, nunca mais consegui ouvir um disco dele.

Todavia, apesar de tudo, lamento sinceramente a sua partida. Descanse em paz.